Praça do Trabalhador
A Praça do Trabalhador está localizada na divisa do Setor Central e o Setor Norte Ferroviário, na área entre as avenidas Independência, Leste-Oeste e Contorno, como indicado no mapa de localização abaixo:
A praça está localizada onde originalmente existia o Centro Ferroviário de Goiânia, inaugurado na década de 1950. Segundo Brandão (2017), o centro foi construído em uma área pública de mais de 500.000 m², doada pelo Estado de Goiás à União. (BRANDÃO, 2017, p. 90). Com relação ao edifício da Estação de Goiânia, Brandão (2017) destaca que não foi identificada uma data exata de inauguração, mas na placa oficial de identificação consta a data 11 de novembro 1952. Segundo a autora, o prédio se tornou um marco na cidade por suas características estilísticas.
Em 1959 foi inaugurado em frente ao prédio da Estação o Monumento dos Trabalhadores, erguido no intuito de homenagear e representar os trabalhadores que construíam a cidade e “(...) o crescimento das lutas trabalhistas e das ideias de justiça social que entusiasmavam vastos setores da população e repercutiam no mundo político” (PERES, 2019). O monumento era composto por pilares triangulares de concreto dispostos em forma de círculo e, na parte interna, dois painéis de pastilhas intitulados “O mundo do trabalho” e “A luta dos trabalhadores”, de autoria do artista plástico Clóvis Graciano.
Segundo Brandão (2017), é a partir da implantação do monumento que foi criada a estrutura da praça, separando-a da área do complexo ferroviário: "Porém, ao mesmo tempo, o monumento iniciou o processo de fragmentação do espaço ocupado pela ferrovia com a implantação de uma via que contornava e isolava o arranjo formando uma pequena praça com o objetivo de permitir o acesso à estação sem transitar pelo monumento. (BRANDÃO, 2017, 106)".
Dez anos depois, em 1969, segundo Peres (2019), durante a Ditadura Militar, o Comando de Caça aos Comunistas (CCC) atacou o Monumento ao Trabalhador, derramando piche fervido nos murais que compunham a obra e remetiam a “cenas do trabalho mecanizado e de lutas sociais como a dos chamados mártires de Chicago” (PERES, 2019). Em 1973, foi feita uma raspagem das pastilhas deterioradas dos painéis, sem plano de recuperação da obra pela gestão municipal à época (BORGES, 2017). Finalmente, em 1987, com a justificativa de uma obra de prolongamento da Avenida Anhanguera que nunca foi realizada, o monumento foi demolido por tratores (DIAS, 2016).
Destarte, com ou sem o monumento, a Praça do Trabalhador foi (e ainda é) cenário para diversas manifestações sociais ao longo dos anos. Para Peres (2019), o descaso do poder público, o abandono e os conflitos políticos-ideológicos ao longo dos anos causaram o apagamento e a consequente demolição do monumento. No mesmo sentido, Borges (2017) reitera que o apagamento do monumento e, consequentemente da praça, se deu pelo próprio contexto da cidade de Goiânia.
Em 2003, através do Decreto Municipal nº 1.805 é criado o Grupo de Trabalho para avaliar o resgate do Monumento dos Trabalhadores e elaboração do "Relatório Monumento ao Trabalhador - Estudos para a reconstrução. Nos anos seguintes à demolição do monumento, diversas propostas no intuito da revitalização da praça e do monumento foram elaboradas, porém a reconstrução nunca aconteceu. As propostas de revitalização da praça e, principalmente, da antiga estação já existiam desde a década de 1980. Analisando reportagens da época percebe-se que o objetivo era sempre ligar o espaço a atividades culturais.
Tendo sido tombada como patrimônio cultural em 2003 pelo IPHAN, em 2013 a Estação foi pleiteada pelo PAC-Cidades Históricas para receber recursos para uma revitalização. Todavia, apenas em 2016 começaram conversas entre a prefeitura municipal e o IPHAN para uma revitalização da praça e da estação. A primeira audiência pública referente revitalização da praça ocorreu em 20/04/2016 na Câmara Municipal. No ano seguinte, em 01/12/2017, o Ministério Público Federal (MPF) instaurou um inquérito civil para apurar as ações e omissões ilícitas do município quanto ao estado de conservação e uso do prédio. Dias depois, 13/12/2017, a prefeitura e o IPHAN assinaram a ordem de serviço para início da obra de restauração da antiga Estação Ferroviária, que previa um orçamento de R$ 5,87 milhões, financiados através do PAC-Cidades Históricas.
O projeto elaborado foi apresentado à imprensa em 18/01/2018. As obras foram iniciadas no mesmo ano, começando pela restauração dos murais internos da Estação, de autoria do artista plástico Frei Nazareno Confaloni. Segundo a Construtora Biapó, contratada pelo IPHAN, as obras tiveram duração de dezessete meses – de dezembro de 2018 a maio de 2018. Porém, o que de fato foi revitalizado foi o edifício da antiga estação e o pedaço da praça no qual está inserido – toda a área que contempla a Praça do Trabalhador ainda se encontra em obras, atualmente (2022).
Porém, até o presente momento apenas a região do entorno imediato da Estação Ferroviária foi inaugurada em 2019, o restante da praça segue em obras. O espaço revitalizado e o espaço ainda em obras não se conectam fisicamente, tendo em vista que a topografia do terreno não foi trabalhada de modo a integrá-los: em visita in loco realizada em 2022, constatou-se que a porção da praça onde fica a Estação Ferroviária não possui ponto de desembargue de transporte coletivo, tampouco local para estacionamento de carros. Para acessá-la pelos fundos do prédio, uma escadaria é um obstáculo inicial para PCD, pessoas com mobilidade reduzida e idosos.
Na visita realizada constatou-se que, semelhante a outros espaços revitalizados na capital, passados apenas quatro anos após a entrega da revitalização, a praça carece de manutenção, limpeza, bem como voltou a ser abrigo para pessoas em situação de rua. Do mesmo modo, o prédio da antiga estação também já apresenta danos patológicos em sua estrutura. Atualmente, o prédio é o Centro Cultural Estação Cultura, e abriga o Museu Frei Confaloni e uma unidade do Atende Fácil (central de relacionamento presencial com a prefeitura municipal). Na visita in loco feita no museu observou-se que o prédio também carece de manutenção, limpeza e, sobretudo, de uma melhor estrutura (mobiliários, sinalização visual etc.) e apoio para que os funcionários possam trabalhar.
Destacam-se as iniciativas da Secult e da diretoria do museu em promover eventos, exposições, visitas escolares entre outras atividades, que são divulgadas no perfil oficial “@museufreiconfaloni” no Instagram e vem atraindo novos públicos para o espaço.
Porém, como visto no caso da Praça Cívica, a revitalização foi uma obra pontual e pouco conectada ao entorno e aos sujeitos que se apropriam daqueles espaços no dia a dia: a praça está localizada nas proximidades da Câmara Municipal e do Terminal Rodoviário de Goiânia. No mesmo espaço ainda está instalada a Feira Hippie; no entorno ainda funcionam a Feira da Madrugada e as lojas da Rua 44, um polo comercial que atrai clientes de todo o país.
Porém, como visto no caso da Praça Cívica, a revitalização foi uma obra pontual e pouco conectada ao entorno e aos sujeitos que se apropriam daqueles espaços no dia a dia: a praça está localizada nas proximidades da Câmara Municipal e do Terminal Rodoviário de Goiânia. No mesmo espaço ainda está instalada a Feira Hippie, a Feira da Madrugada e as lojas da Rua 44, um polo comercial que atrai clientes de todo o país. A questão dos feirantes em Goiânia é muito complexa. Eles sempre são movidos de um canto para outro no Centro e em outros bairro com os projetos de intervenção urbana, como se pudessem se “rearranjar” para onde quer que forem.
O conflito entre os feirantes e a administração municipal se arrasta desde a década de 2000, quando a Feira Hippie deixou de ser realizada na Praça Cívica e na Avenida Goiás e foi realocada para a área do antigo Centro Ferroviário. Por exemplo, os camelódromos antigos e os vendedores ambulantes da Avenida Goiás foram levados para o Mercado Aberto da Paranaíba, inaugurado em 2003. Todavia, por ficarem totalmente desarticulados da Região da 44, que cresceu absurdamente, o comércio lá se tornou insustentável e vem diminuindo bastante nos últimos anos. Em 2019, após a inauguração do espaço da estação ferroviária, as obras no restante da Praça do Trabalhador continuaram, porém sem que informações fossem dadas aos feirantes locais. Com a reforma de 2018-2019 o espaço foi mais uma vez fragmentado, criando-se duas praças: uma “Praça da Estação” (o espaço revitalizado) e uma “Praça do Trabalhadores” (onde acontece o comércio popular e a Feira Hippie). De mesmo modo, o projeto elaborado e apresentado pela prefeitura para o restante da praça, também não se conecta com o entorno da estação, lidando com os dois lados da Praça do Trabalhador como se, de fato, fossem duas praças independentes.
As fronteiras existentes entre as duas praças – a praça da Estação versus a praça dos Trabalhadores – para além dos limites já impostos pelo próprio terreno, se tornam também simbólicas pois é possível perceber uma valorização do patrimônio material em art decó, porém com uma defasagem quanto a manutenção e estrutura para atividades; em contrapartida, do outro lado um entrave com o comércio e a cultura de feiras populares, representada pela Feira Hippie e a Região da 44. A praça da Estação recebe eventos artísticos, apresentações da Orquestra Sinfônica, decorações em época natalina etc., enquanto a praça dos Trabalhadores segue aguardando a finalização das obras (adiadas novamente em dezembro de 2022), e condições dignas para os feirantes possam trabalhar.
Do mesmo modo, a Feira Hippie segue até os dias atuais movimentando o capital e servindo como fonte de renda para milhares de famílias de classes menos favorecidas, como visto nas reportagens citadas acima. Para além da falta de articulação entre os dois espaços – as duas praças –, vale ressaltar que a praça possui um sentido simbólico como espaço de luta, de resistência, de apropriação da urbe, um lugar, de fato, territorializado pelas camadas mais populares por meio da força de trabalho e do consumo. Os trabalhadores, que ali resistem, ressignificam suas estratégias de sobrevivência, fortalecem sua memória e vivem intensamente o centro de Goiânia com todas as suas contradições e relações antagônicas, contrariando todos os discursos de que o “Centro morreu”, o “Centro foi abandonado” etc. e legitimando-o como lugar de memória e de ativação popular dos espaços públicos.
ALCANTARA, Q. Audiência hoje vai discutir revitalização da praça do Trabalhador. Goiânia: Sala de Imprensa – Prefeitura Municipal de Goiânia. Disponível em: <https://www.goiania.go.leg.br/sala-de-imprensa/noticias/audiencia-hoje-vai-discutir-revitalizacao-da-praca-do-trabalhador>.
BORGES, P. C. A. Mudanças urbanas e fragilidades da política de memória (A destruição do Monumento ao Trabalhador em Goiânia). Brasília: Revista Sociedade e Estado, vol. 32, n. 2, Maio/Agosto 2017, p. 345-370. Disponível em: < https://www.scielo.br/j/se/a/rqCLx3ZsSJyWgn7mrX6tzNp/?lang=pt&format=pdf>.
BRANDÃO, S. B. A antiga linha férrea de Goiânia. De símbolo da modernidade à obsolescência. Dissertação (Mestrado em Projeto e Cidade) - Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2017. Disponível em: < https://repositorio.bc.ufg.br/tede/handle/tede/77 76>.
DIAS, E. Goiânia e sua (falta de) memória: a saga para reconstruir o Monumento ao Trabalhador. Goiânia: Jornal Opção, reportagem veiculada em 01/05/2016, edição n. 2130. Disponível em: <https://www.jornalopcao.com.br/reportagens/goiania-e-sua-falta-de-me moria-saga-para-reconstruir-o-monumento-ao-trabalhador-64949/>.
JORNAL OPÇÃO. Feirantes da Praça do Trabalhador cobram informações da prefeitura sobre reforma no local. Goiânia: Jornal Opção, reportagem veiculada em 19/03/2019. Disponível em: < https://www.jornalopcao.com.br/ultimas-noticias/feirantes-da-praca-do-trabalhador-cobram-informacoes-da-prefeitura-sobre-reforma-no-local-171937/>.
_______________. Proposta de revitalização da Praça do Trabalhador não atende anseios dos feirantes. Goiânia: Jornal Opção, reportagem veiculada em 22/05/2019. Disponível em: < https://www.jo rnalopcao.com.br/ultimas-noticias/proposta-de-revitalizacao-da-praca-do-trabalhador-nao-atende-anseios-dos-feirantes-186052/>.
_______________. Feirantes pedem que revitalização da Praça do Trabalhador fique para janeiro. Goiânia: Jornal Opção, reportagem veiculada em 27/05/2019. Disponível em: <https://www.jornalopcao.com.br/ultimas-noticias/feirantes-pedem-que-revitalizacao-da-praca-do-trabalhador-fique-para-janeiro-186859/>.
MAIS GOIÁS. MPF investiga ações ilícitas da prefeitura em relação à Estação Ferroviária. Goiânia: Portal Mais Goiás, reportagem veiculada em 05/12/2017. Disponível em: <https://www.maisgoias.com.b r/cidades/mpf-investiga-acoes-ilicitas-da-prefeitura-em-relacao-a-estacao-ferroviaria/>.
PREFEITURA DE GOIÂNIA. Monumento ao Trabalhador – estudos para reconstrução: Relatório. Goiânia: Decreto n. 1.805, de 24 de junho de 2003. Grupo de Trabalho, 2003. Disponível em: < https://pt.scribd.com/document/24171881/Relatorio-Monumento-ao-Trabalhador-Estudos-para-Reconstrucao>.
PERES, N. B.. Lugares de Memória dos Trabalhadores #17: Monumento ao Trabalhador, Goiânia (GO). Rio de Janeiro: Laboratório de Estudos de História dos Mundos do Trabalho (LEHMT), 2019. Disponível em: <https://lemtufrj.wordpres s.com/2019/12/05/lugares-de-memoria-dos-trabalhadores-17-monumento-ao-trabalhador-goiania-go-nelio-borges-peres/>.